as cabeças das pessoas negras

  • autoria: Nafissa Thompson-Spires
  • tradução: Carolina Candido
  • leitura concluída: ☆☆☆☆☆

    eis mais um livro do Leia Mulheres Curitiba, mas um que eu falhei enormemente em terminar antes do encontro (no qual não consegui ir, ainda por cima -_-). acontece com os melhores leitores, né?

    essa coletânea foi outra escolha primorosa no nosso "estudo do conto" desse semestre. desde o prefácio da Winnie Bueno (criadora do projeto Winnieteca que conecta leitores negros & doadores de livros, com o qual já tive o prazer de colaborar pra uma alegria enorme & partilhada) até as notas finais da autora, passando pela tradução fluidíssima, tudo é pensado & pesado com exatidão. os contos exploram questões de raça & classe na sociedade estadunidense por tudo quanto é viés, sem pedagogismo & com uma variedade narrativa de cair o queixo. a Nafissa é outra autora que sabe sobre o que quer falar & qual o melhor jeito de falar disso.

    previsivelmente, amei que vários contos têm personagens em comum, porque sou a louca dos pontos de vista (multiperspectivismo, polifonia, chame do que quiser). essa estratégia, além de ser uma delícia narrativa, amplia a visão do leitor sobre o que é ser negro nos Estados Unidos, sem o menor risco de cair em reducionismos ou estereótipos. a gente vê a história de um ângulo, depois com foco em um personagem secundário pra quem aquilo era Outra Coisa & ainda uma terceira vez com distanciamento de tempo. qualquer um pode ser herói ou vilão ou qualquer coisa no meio do caminho, como é na vida.

    o primeiro conto, todo fragmentado & didaticamente intitulado "As cabeças das pessoas negras: quatro esboços chiques, dois contornos feitos a giz e nenhum pedido de desculpas" é meu favorito. tem cosplay, arte, horror cotidiano, retomada histórica, criança comendo porcaria, manipulação da mídia, quadrinhos & geekices, violência policial, além de um lirismo delicadíssimo & ao mesmo tempo afiado como uma navalha. olhem só isso:
    Acho que um tiroteio policial é muito melodramático quando a história já era interessante por si só, e a minha preocupação com raça talvez seja exagerada, mas foi Flannery O'Connor, acredito eu, que disse - e digo "acredito eu" mais como um artifício, para parecer um pouco indiferente quando, na verdade, sei que de fato foi ela quem disse - que tudo que sobe deve convergir ou algo assim ("ou algo assim" sendo novamente um recurso). Mas isso faz com que o fim pareça deliberado ou sobredeterminado, quando, na verdade, não o era, ainda que eu acredite - eu sei - que foi Donika Kelly que falou sobre "o modo como um corpo deixa marcas", ou, nesse caso, um contorno, uma impressão.

    nosso resumo costumeiro: 5/5! mil perspectivas, gênero raça & classe, nerd fazendo nerdice, amor, frutarianos, adolescentes sofridas, comunidade negra, ASRM, fetiche, brutalidade, e-mails malcriados, redes sociais são o inferno, assim como estudantes universitários.


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